quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Possibilidades.

Nada mais faz sentido. A razão sucumbiu aos gritos desesperados da loucura. A insanidade se apossou da mente como um vírus que consome a célula. Como um câncer. Um olhar azul frígido se estancado em sua face inexpressiva, podia ver-se, vez ou outra, um leve marejado, numa tentativa frustrada e recobrar o juízo. Os cabelos grisalhos desarrumados, já compridos pela falta de interesse em cortá-los, sujos e oleosos, e a barba por fazer, com algumas duzias de fios brancos emaranhando-se aos negros, demonstram ser vítimas dos maus dias.

Quantos dias se passaram? Não se sabe. O tempo não caminha mais como antes. Se demora propositalmente, talvez. O faz para atormentá-lo. O corpo magro não sente fome. Não sente sede. Não sente frio. Não sente nada, enquanto caminha por qualquer lugar, em qualquer hora, em qualquer sentido, envolto em seu casaco surrado, comido pelo tempo. O jeans velho já não passa de um trapo, enquanto os sapatos são instrumentos de tortura. O corpo cansado não tem mais vida. Dia após dia, sofrimento. A garganta apertada. A agônia no silêncio da noite. Depressão. Desespero. Neste meio, há apenas um desejo profundo, da alma, de libertar-se. De correr ao infinito. De poupar o corpo do inferno de estar vivo. 

A cada dia, este desejo cresce. Inunda seus pensamentos. Seus olhos contemplam as possibilidades. Por um instante parece sensato. Mas que benefício lhe traria? O desconhecido o assusta mais que a própria vida. Está agrilhoado ao fardo da tristeza. A morte ri de sua fraqueza, enquanto está jogado em meio às fétidas acusações do superego, enquanto a vida lhe espanca e um mísero resquício de lembranças ainda o dá forças para tentar manter-se, porém, a lucidez o abandona gradativamente, e as possibilidades se restringem a falsas esperanças.

Estaria disposto a qualquer coisa para erradicar a dor dentro do seu peito. Para espantar os demônios que o assolam à noite. Para ter paz. Faria qualquer coisa para ter de volta sua razão. Para ter de volta a vida que tinha. Para enfrentar as convicções erradas, e criar novos conceitos. Venderia sua alma, ou o restante dela, para poder aprender tudo novamente. Para rir novamente. Para sentir fome e frio. Venderia a alma para tê-la por um dia.

Somente um dia, e lembraria o que é felicidade.

domingo, 10 de novembro de 2013

As estrelas não brilham

No meio da madrugada, enquanto meninos estouram rojões no morro para avisar a galera do suposto perigo, eu durmo.
As 5h quando a entregadora de jornais está fazendo café antes de ir trabalhar, eu ainda estou dormindo.
Enquanto o servente de pedreiro está comendo sua marmita, as 11h da manhã, eu estou na aula.
Enquanto alguns agonizam em seus leitos de hospitais, estou navegando na internet.
Enquanto a menina vende CDs pirata em um bar ao ar livre, eu como peixe no mesmo bar.
Enquanto a mãe leva o filho para fazer quimioterapia, as 7h da manhã, no ônibus lotado, eu estou me sentindo cansada e injustiçada, no mesmo ônibus, em pé.
Enquanto o cachorro abandonado está procurando comida no lixo, eu estou fazendo carinho na minha cachorra e a achando o cão mais especial e único do mundo.
Enquanto a criança que apanha do pai e tem a mãe com câncer, está na escola em uma tarde no meio da semana, eu estou tentando me enturmar em uma festa cheia de imbecis.
Enquanto essa mesma criança brinca na hora do recreio, eu tomo mais um copo de bebida para ficar mais sociável.  

Postado por Thami

sexta-feira, 12 de julho de 2013

Alguém sabe dizer o que é normal? Pode parecer tão natural

Acho que fui uma criança um pouco diferente das outras. Acho pelo simples fato de não ter certeza nem do que eu acabei de comer, após descobrir que a cereja em calda que gosto de colocar no sorvete na verdade é feita de chuchu (segundo uma pessoa que diz que trabalhou na fabrica), não tenho mais certeza de nana, nem mesmo se a cereja em calda é realmente feita com chuchu e não com cerejas. Na verdade não tenho certeza nem das cores que vejo a minha frente, pois quem garante que meus olhos não enganam meu cérebro? Ele as vezes é tão bobinho.

Com sete anos ainda chupava chupeta, e não eram chupetas normais, eram chupetas velhas. Não que isso não seja normal, mas eram chupetas ‘’nojentas’’ para ser mais exatas.
Ainda na segunda série levava uma chupeta escondida na mochila para ir chupar na hora do recreio no banheiro, escondida de todos.

Quando ainda menor por volta dos 3/4 anos, quando minha mãe não dava atenção no que eu falava, imitava uma galinha, batendo os braços com os cotovelos flexionados, e cacarejando, ou então imitava uma velhinha com uma bengala. Eu realmente tinha atitudes muito infantis, pois atualmente quando isso acontece eu imito o Cristo Redentor, o Saci-Pererê ou eu canto ópera.  

Queria um carrinho de controle remoto, mas sempre ganhava uma Barbie. Queria ser menino, usar roupas do Mickey ao em vez da Minnie, ser a melhor dos primos no vídeo game e fazer xixi de pé. Mas também achava os meninos atraentes, em especial o Vitor, o menino loirinho e bobinho da minha turma na primeira série, mas quem mais me chamava atenção não era bem os meninos e sim os homens. O professor Eduardo que dava aula pra outra quarta série, que não era a minha, era lindo, e o professor de artes da terceira também era muito bonito, até mais que o Eduardo. O pai da personagem da novela Carinha de Anjo então... Oh my God, e aquele ator do plantão médico também era de tirar suspiros, entre outros que não é necessário comentário.

Essa coisa de querer ser menino passou rápido, com uns 8 ou 9 anos já estava conformada em me equilibrar para fazer xixi em banheiro publico e amarrar o cabelo para ir pra escola, para não pegar piolho.
Após algumas consultas com uma psicóloga infantil minha mãe ficou mais calma ao saber que eu não seria um serial killer ou sofresse de sérios distúrbios de egoísmo e mentais. Só porque fiz uma cirurgia em uma boneca nova, abrindo-a com a tesoura e simulando seu sangue com ketchup e retratar essa cena nos desenhos livres que a professora dava pra fazer, e gritava do nada na sala de aula quando estava tudo muito quieto. Quanto aos distúrbios de egoísmo era só por não querer dividir nada com ninguém, e vender em vez de dar, na hora do recreio quando algum amiguinho pedia um pouco/pedaço do lanche:
- Me da um pouco de amendoim?
- 20 centavos 5 amendoins
- Tá bom, amanhã eu trago o dinheiro.
Ou então:
- Da um adesivo do seu caderno?
- 20 centavos os pequenos, esses maiores é 30 e os grandes 50.

Meus pais notaram quando eu não pedia mais dinheiro para comprar lanche, pois o que eu faturava com as vendas na escola dava pra comprar o lanche e vender em pequena quantia, e me rendeu algumas consultas com a psicóloga. Mas o que mais deu dinheiro foi o caderno de desenho que minha irmã me deu, contendo 50 desenhos feitos por ela, e eu vendi todos a R$1, e os pintados a R$1,50. Neste caso eu já era maior, deveria ter uns 9 anos e proporcionei orgulho para meus pais pela ideia de ‘’fazer dinheiro’’, apesar de ter vendido um presente.

Meu pai dizia que eu tinha espírito de comerciante, mas esse tal espírito foi sumindo com o tempo até desaparecer e hoje eu ser uma ameba com vendas.

Além do Pedrinho, meu namorado imaginário que tive por volta de uns 4 anos de idade, aos 7 tive o Hugo, que não era meu namorado e nem imaginário. Quer dizer, em partes. Hugo, que descanse em paz, era uma bola de plástico em que eu desenhei o um rostinho e um boné. Eu e o Hugo nos divertimos por muito tempo. Nós íamos a vários campeonatos juntos. Ele era uma espécie de Pokémon, mas não era um Pokémon, era uma bola mesmo. Ah, e eu não era a Thami, eu era um personagem também, no qual prefiro não detalhar muito.

Contudo, minha viajem imaginaria não parava por aí. Eu frequentava a ‘’Escola do Banho’’. Na mesma época em que tinha o Hugo. Frequentei a ‘’Escola do Banho’’ por mais de dois anos. Nessa escola tinha vários amigos e alguns inimigos, imaginários é claro, e era... Na hora do banho. Tinha competições como o jogo da bucha e ganhava quem fizesse mais pontos com a bucha. Minha mãe se intrigava do porque quando eu saia do banho o teto estava sempre molhado. Mal sabia ela que eu estava em uma competição superimportante representando a ‘’Escola do Banho’’. Lembro-me quando acertei a bucha na janela e ela caiu para fora do banheiro e encontraram a tal no corredor. Foi complicado explicar já que ninguém me entendia.

Atualmente com quase 20 anos posso dizer que estou melhor dessas viagens, que a meu ver não é nada anormal, mas não posso afirmar que me curei disso. Na verdade acho que não tem cura, pois não deve ser nenhuma doença. Não que eu continue frequentando a escola do banho. Juro que não frequento mais, juro juradinho, já que minhas viagens atuais são mais sofisticadas e a  ''Escola do Banho'' é algo muito fichinha, mas não cabe comentar sobre isso no momento. Talvez daqui umas décadas.



Postado por Thami

segunda-feira, 1 de julho de 2013

Cresce o Cinza.


Hoje é um dia diferente. Não tão diferente aos olhos do cotidiano, mas sinto, lá no fundo, de maneira sutil e descompromissada, que este é um dia diferente. Hoje é um dia monocromático. Cinza.

O céu é cinza, com nuvens espessas, baixas e disformes. Chuvisca. Aquela água fria, fina e entediante, levada pelos ventos sem destino. A rua do velho hospício também é cinza. Os paralelepípedos desordenados, que insistem em aparecer nos trechos onde o asfalto foi quebrado e esquecido, reluzem ao solene toque da água, como se a chuva fosse uma carícia lenta e amorosa. Brilham sim, mas brilham cinza.

Os prédios, que outrora formavam as vívidas alas psiquiátricas, apesar do conteúdo não ser nem um pouco agradável, agora tão quietos e descoloridos fazem a paisagem afundar em melancolia. A tintura branca, rosada, ou até mesmo aquele tom verde-menta se foram dando espaço à doença cinza que se apossou descaradamente da rua. As paredes cobertas de rachaduras e musgos, e as velhas janelas de madeira com seus batentes comidos pelo tempo dão um aspecto solitário e improdutivo. As grades já enferrujadas protegem o antigo santuário dos jardins, hoje, transformados em lembrança.

Os galhos secos se penduram em corpos frios que, num tempo que há muito já se findou, foram árvores. Flores são desconhecidas. Tudo o que se vê são pequenos arbustos de espinheiros, e o capim velho se arrastando pelos caminhos. Situação calamitosa, digna de pena. As pragas nascem, crescem e morrem todos os dias. Os jardins, com suas mais variadas flores, metamorfosearam-se na personificação viva da depressão, consumindo-se a si mesma num canibalismo visual degradante e odioso. O filho bastardo de um mundo em escala de cinza.

Mas minha alma não mente e jamais me engana. Hoje não é apenas um dia chuvoso na rua do sanatório. Vejo uma pequena coisa diferente, lá longe, subindo, no meio da rua. Singela e serena, anda sorrindo. Não anda, mas flutua com seu vestido coral, encharcado e colado ao seu corpo reto. No meio de um ambiente tão fosco, e sobre uma pele tão branca, o coral parece carmesim.

A cada passo uma nota ecoando. Dança. Gira. Ri. Descalça, não faz questão dos poucos, mas insistentes, paralelepípedos da rua que a fazem deslizar. O cenário não afeta sua alegria. Os cabelos ruivos cacheados voam jogando água pelos lados, enquanto as sardas nas maçãs do rosto observam de cima as pequenas covinhas nos cantos da boca. Estonteantemente linda, na mesma proporção em que é despretensiosa.

Seus olhos verdes não enxergam este mundo. Estão presos distantes daqui, contemplando a própria felicidade. Não veem nada além daquilo que sua mente em devaneios vê. As cores infinitas que formam a luz branca. Sente o cheiro da terra fértil e dos eucaliptos distantes. Ouve o som da música dos pássaros, e a cantoria do vento. Sente a chuva lavar-lhe a pele na mesma medida em que lava-lhe a alma.

Em seus dedos, de unhas comidas e cutículas destroçadas, pende-se uma rosa. Não apenas uma rosa. Um Príncipe Negro. Majestoso, e imponente, com suas pétalas escuras e raras. Um príncipe para uma Rosa, ou uma rosa para um Príncipe?! Não se sabe ao certo, também não se faz necessário saber. O que se sabe é que ela plantou esta rosa, por entre as falhas do asfalto, em frente ao velho portão enferrujado. O que se sabe é que deu as costas e foi embora, do mesmo jeito que chegou, dançando além do chão, sorrindo e vivendo seu mundo. O que se sabe é que trouxe do seu mundo a essência, e a deixou aqui. Plantada no meio da rua. Levou consigo todo o cinza. Levou consigo todo o velho, todo o cotidiano, toda doença. Deixou para nós o seu mundo, o seu olhar.

Deixou para nós o seu jardim, no meio do asfalto, na rua do hospício. Trouxe-nos de volta a loucura que nos faltava. A insanidade que havia morrido e que nos é necessária para sermos felizes, para sermos plenos. Trouxe de novo a beleza das cores, e das pequenas coisas. Dizem que ninguém entende os loucos, mas só aos loucos pertence a sabedoria do mundo.

quarta-feira, 8 de maio de 2013

Estou Bem.




Acomodada no mesmo canto escuro, envolvida em seus braços, longe de tudo aquilo que lhe é posto em volta, ela fica. Está bem. Está quieta. As vozes que a rodeiam, apesar do tumulto constrangedor e desnecessário, não interferem na sua música. Suas músicas. Músicas que ninguém mais ouve. O barulho incomoda os que se julgam melhores, mas ela não faz questão. Ela está bem.

Seus olhos quase negros cintilam nos poucos feixes de luz, e lentamente se fecham enquanto a materialidade se esvai em sonhos. É bela por natureza. Seus dedos se enrolam num pequeno punhado dos seus cabelos castanhos ondulados, como se, de alguma forma, tentasse preservar a atenção em si, fugindo de todo o resto. Fugindo de todo o mundo, de toda futilidade, sempre correndo, sempre bem.

Em sua mente, ninguém sabe o que se passa. Ninguém sabe o que sente, o que pensa, o que gosta. Parece não existir além de si, mas está bem ali. Marcando seu espaço, mostrando sua existência com seu silêncio. Nada se ouve, pouco se vê, mas todos sabem que existe. O contato é restrito e controlado. Suas palavras são calculadas e cheias de educação, soam singelas e desprovidas de qualquer ofensa. Ditas sempre sob um esboço de sorriso. Graciosa. Sempre bem e agradecida, prefere o silêncio. Um anjo. Pelo menos é o que seus gestos sugerem.

Um olhar distante e condescendente, um sorriso apertado, como se olhasse o mundo tentando enxergar-se, e apenas descobre que seus heróis morreram de overdose. Mas é passageiro. Ela está bem. Sempre bem, e agradável. Quieta no seu silêncio. Parece-me uma lágrima no canto do olho esquerdo. Impressão minha, ela está bem.

sábado, 20 de abril de 2013

Let's make this fleeting moment last forever

Nós deitamos no gramado próximo ao planetário, após ver a programação do mesmo, numa sexta à tarde.
- Sempre ouvimos falar do sistema solar, mas e o sistema lunar?
-..., o sistema lunar? Ahahahah
- É, porque pouco é falado dele, tipo, quais serão os planetas do sistema lunar?
- Ahahaha, puta que pariu.
A calça que me esquentava cada vez mais com o calor de 26° C protegia minhas pernas de pinicar por causa do gramado mal cortado.
Dormimos um pouco, ou melhor, cochilamos, com minha perna presa á sua e sua cabeça sobre meu peito. Fomos acordados por uma mosca varejeira.
- Mas e se for muitas moscas varejeiras, então como será o nome dela?
- Atacadeira!
- Ah sim, realmente, faz todo sentido.
- É, porque varejeira é quando é uma só, mas quando são muitas, é atacadeira.
Acho que só dormindo mesmo para evitar o excesso de babaquice.


Postado por Thami

Um pequeno continho

Escrevi a tinta, azul, sobre você no papel branco sem linhas e nenhuma margem.
Fiz dele um avião, em dobraduras. Um avião de papel.
As primeiras dobraduras não deram certo, então no avião ficaram algumas marcas. Marcas do erro, por não saber exatamente de que modo a dobradura traria um bom avião de papel.
Mas ele não ira viajar todos sete mares, nem todos os cinco continentes e tampouco ira chegar até você.
Talvez ele não passe nem da janela do meu próprio quarto.

Postado por Thami

terça-feira, 9 de abril de 2013

Coisas de criança, coisas de adulto


Ele era um pouco maior que eu, uns dois anos mais velho, pele morena, cabelo crespo, passado na maquina um, bem baixinho. Esse foi Pedrinho, meu namorado imaginário que tive com 4/5 anos de idade.
Ele era sempre presente, estava sempre comigo durante as tarde. Tínhamos uma filha, chamada de filha mesmo (a boneca não tinha nome).
Nós íamos passear no bosque enquanto seu lobo não vinha, íamos comer no Mc Donald’s do shopping, brincávamos no balanço e conversávamos na varanda do meu quarto.
O Pedrinho não era o tipo de menino que me atraia, e eu sabia disso. Eu não o achava bonito, e ele era bem quieto. O que mais me soa estranho, atualmente quando me lembro dele, é que eu poderia muda-lo a qualquer hora, já que ele era parte da minha imaginação, mas eu o mantinha da mesma forma.
Não sei por quanto tempo namoramos, e nem como nos conhecemos. Minha mãe sabe mais dele do que eu, já que eu contava tudo para ela sobre ele.
Ele simplesmente sumiu da minha vida, de um dia para o outro, e também não me recordo como foi nossa ultima tarde junto.
Já ouvi várias historias de pessoas que tivessem tido amigos imaginários na infância. Eu, não tive um amigo, mas tive um namorado, e nunca soube de outra criança que também tivesse tido.
Um pouco mais tarde, com uns 8 anos de idade, comecei a criar outro personagem. Mas dessa vez eu não participava da historia, apenas vivia, todos os dias, o meu personagem imaginário, em uma vida paralela a minha.
Esse personagem não parou de existir como o Pedrinho, mas ele mudou bastante no decorrer dos anos, e atualmente, em meio de meus quase 20 anos, ele ainda existe, no escuro do meu consciente.
Ele não é meu amigo, nem meu namorado. Ele nem me conhece, nem sabe que eu existo. Já tive umas participações na vida dele, mas foi como figurante.
Portanto, eu não dou vida para ele todos os dias, como á alguns anos atrás, pela correria do dia a dia, e por ter outras coisas melhores para fazer. Talvez isto seja um amadurecimento, e este ira desaparecer assim como o Pedrinho, e vou substituí-lo com coisas chatas da vida. Coisas de adulto.

Postado por Thami

terça-feira, 26 de março de 2013

Bom Dia Vida.


Mais um dia se inicia, e como de costume, não desejaria abrir os olhos.
Começa com um som. Um ritmo crescente e grave. Compassado. Distante. Aparentemente, desconfio que nem ao menos existe, mas rapidamente percebo que está mais próximo do que imagino. A batida acelera no mais profundo do ouvido, entre a audição e a esquizofrenia, e, a cada tempo, uma pequena dor. Uma leve pontada na boca do estômago, e tal desconforto é igualmente crescente.
A pulsação segue constante, aumentando gradualmente, tanto em velocidade, como em volume, chegando ao ponto de assimilar-se a um ruído ininterrupto, onde nem sequer os pensamentos conseguem ser mais audíveis. Então, quando este ruído fica estarrecedor e caótico, é neste instante que a dor, que outrora era um leve desconforto, eclode e se espalha como uma praga, como uma epidemia, infestando toda e qualquer parte do meu corpo. Tecidos, órgãos, até mesmo a mente.
A musculatura fica tensa. Petrificada. O sangue correndo me parece ter a espessura de um óleo impuro. Queima. As extremidades, por outro lado, estão excluídas desta ardência. A vida esqueceu-se das mãos e dos pés. Frios e rígidos, ambos suam. Minam água. Os membros renegados clamam pelo calor do corpo, tremendo incisivamente esperando qualquer resposta. Grito. Talvez um berro odioso, cercado de temor, com uma sobra imensa de dor. Independente do que seja, grito.
Há contrações por todos os lados. Intestinos, rins, diafragma, todos, infelizmente, se contorcendo como um bando de epiléticos, monstruosamente atenuando a dor. Os pulmões trabalham em vão. Mesmo com todo o ar do mundo ao meu alcance, é insuficiente. Nesta força vil de respirar, junto com o ar, se vai também a voz. Torno-me mudo.
Também se foram os sentidos. A audição se resume ao soar frenético da arritmia, enquanto o olfato se dissipa numa asma mortal. As papilas gustativas morreram, e tudo o que sobrou é um amargo e uma salivação que, para minha frustração, tenta desesperadamente adoçar a boca, enquanto os olhos cegos derramam lágrimas. Lágrimas igualmente amargas. Lágrimas que suspiram desejosamente por um alívio. Por uma paz.
Nada mais faz sentido. Nada mais vale a pena. O mundo é uma ferida cauterizada, suja. Um vazio negro e profundo, fétido, preenchido apenas por agonia e dor. Dor, dor, e apenas dor. Crescente e ininterrupta. Um sofrimento eterno. Duradouro. Infinito. Intensificado a cada segundo, até que, em seu ápice, um clarão e um ribombo arrebatam minha mente.
No corpo, uma dor aguda, como de uma faca penetrando no peito, deslizando por entre as costelas e cravando-se no arco da aorta, assim como uma bailarina desliza em suas sapatilhas sobre o palco, pousando delicadamente sobre o piso de taco encerado. A dor insuportável de uma implosão, acompanhado de um silencio memorável, claro e límpido. Um lindo paradoxo entre a perfeita introspecção e o fim tenebroso, afogado em sofrimento. Segundos, horas, eras. O tempo é indiferente. Um mero acessório desrespeitado.
Faz-se paz. Tão esperada paz. Acaba-se toda a dor. Todo o sofrimento lentamente se vai. Plenitude, com uma marca de esperança cravada na mente. Encontro-me em um estado ébrio. Quieto. O mundo não gira. Os sentidos vão retomando suas funções, um a um, vagarosamente, como se discutissem entre si se são realmente necessários. As cores vão tomando forma. Os cheiros. Os gostos. Os membros vão voltando aos seus costumeiros afazeres. Tudo voltando ao normal. Tudo se sensibilizando novamente, enquanto o tempo torna a caminhar e o mundo a girar.
Levanto-me então, e caminho depressivo para a vida, moído por mais uma noite de abstinência. Abstinência do teu corpo. Abstinência do teu cheiro, do teu sorriso. Abstinência do teu abraço. Dos teus cabelos no meu rosto. Abstinência do teu olhar cor de mel, e dos teus beijos tão doces quanto. Abstinência de te amar como merece.

sábado, 16 de março de 2013

Mãos ao alto: Fique onde está!

Sabe aquele jardim? Aquele em que plantamos aquela semente.
Naquele jardim há uma arvore que é tão velha quanto eu. Envelhecemos mais de 10 anos em menos de 5 meses. Com folhas verdes pelo chão, folhas bonitas, como as da primavera, e nos galhos folhas secas, como as do outono. Mas estamos no verão?

Há algum tempo venho sentindo algo diferente, como se eu tivesse ficado em coma por um tempo e tivesse acordando, gradualmente, ainda mais quando olho aquela arvore. Hoje sinto que despertei totalmente desse sono profundo, regado a sonhos, esperanças, fantasias e pesadelos.

Hoje notei que há palavras que não precisam ser ditas. Há atitudes que não precisam ser tomadas. Há pensamentos que não são necessariamente pensados. Há eu sem você.

Há eu sem você hoje, quando notei que perdi sua foto. Fucei em minha caixinha de porcarias, e não achei a mesma.

Hoje sinto falta por não sentir a menor falta.

Hoje o amor morreu como num assalto a mão armada.

Postado por Thami

quinta-feira, 28 de fevereiro de 2013

Eu perdi as chaves


Olá, tudo bem?

Então, eu gostaria de pedir minhas borboletas de volta. Aquelas que apareciam no meu estomago, e que você levou-as embora.
Como se não bastasse simplesmente ir, você se achou no direito de levar consigo minhas borboletas, e isso eu não lhe perdoo. Perdoo-lhe por ter partido, mas não por ter as levada contigo.
Seria muito pedi-las de volta? Seria difícil recupera-las?
Eu poderia lhe processar por isso?
Caso você as devolva, gostaria de pedir também minhas outras palavras. Aquelas que não são sobre você, que por coincidência, foi voando junto com as borboletas.
Às vezes sinto que estou perto de recuperar ambos. Um perto que vai se afastando quando estou chegando.

Às vezes sinto que não sinto.
Espero seu feedback.

Obrigada pela atenção.


Postado por Thami 

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2013

À 240 mil milhas da lua


Estava andando pela rua quando lhe avistei. Você entrou pela minha porta, mas um dia saiu, assim como entrou.
Agora sou uma borboleta no aquário. Este aquário cheio de pedras.
Sou um peixe fora d’água, no asfalto quente.
Sou um tigre na Marginal tiete de São Paulo, cercado por carros, pessoas e poluição.
Sou um poodle na floresta fria e úmida.
Sou um camelo na Antártida, derrapando no gelo gelado.
Mas acima de tudo sou um pinguim no deserto do Saara tendo as miragens mais legais e divertidas que poderia ter.
A maior parte do que eu lembro me faz certo de que eu deveria ter impedido você de sair pela porta. Mas se eu tivesse feito isso, eu teria você sem você. Teria um nós sem nós, e um eu sem eu.
Eu não consigo nem ao menos sofrer, porque sofrer seria menos do que isso que sinto. Não consigo nem sofrer, nem sofrer.


Postado por Thami

segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Chove.

Desce a chuva em pleno dia,
Torrencial, água fria,
Escorre, gelada e esguia,
Lava, entre tudo, a dicotomia.

De encontro à pele, mel.
De encontro à alma, fel.
Irrompendo em vôo por todo o céu.
Dissolvendo até o mais negro véu.

Na pele, o simples.
A lembrança dos pequenos fazeres,
Dos esquecidos toques impares.
Lavando o corpo dos males.

Na alma, a introspecção.
A já obsoleta sensação 
de ter um mundo que cabe na mão.
Conhecer-se a si profundamente, então. 

Mas somos seres tricotomicos.
E onde ficam nossos espíritos?
Na água, nos sons místicos.
Pneuma materializada nos pingos.

Nosso espírito feito chuva,
Lavando cada canto, cada curva.
Nosso corpo. Nossa alma, antes turva,
Agora pura. 

Plenitude.



domingo, 13 de janeiro de 2013

O monstro ainda está vivo


Falei para todos que eu o tinha matado, mas menti. Quando descobriram, eu disse que ele estava morrendo, e assumi não te-lo matado, mas que logo teria seu fim.
Menti novamente, um tempo depois, dizendo que ele finalmente tinha morrido, mas caí em contradição novamente, e todos puderam ver, com seus próprios olhos, aquele enorme monstro, que alem de não ter matado, ainda o alimentava.
Tornei a mentir. Alguns não acreditaram mais. Eu não acreditei mais.
Mas quando vi que ele realmente estava morrendo, tentei ressuscitá-lo, logo eu, que sempre o quis ver morto, e assim, não teria mais que mentir e nem entrar em contradição.
Ressuscitei-o, e continuo mentindo e o enterrando ainda vivo. Alguns acreditam na sua morte, outros não mais. Eu acredito, às vezes.


Postado por Thami

sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

Feliz Ano Novo

Feliz Ano Novo aos que tiveram perdas no ano velho e ainda assim recolhem pedras em suas aljavas. Aos colecionadores de afetos que jamais permitem que suas lagartas se transmutem em borboletas. Aos cínicos repletos de palavras sem raízes no coração.

Feliz ano Novo às bordadeiras de emoções, que gastam a vida desfiando intrigas e agulhando a boa fama alheia. Aos céticos desprovidos de horizontes e aos que debruçam sobre a própria solidão para contemplar abismos.

Feliz ano Novo aos que asfixiam a criança de si e aos que se fantasiam de palhaço para camuflar tristezas. Aos que gastam a vida contando dinheiro, sempre em débito com o amor. Aos que acumulam bens e desperdiçam virtudes, ajuntam poder e semeiam mágoas, galgam a fama e pisam em sentimentos.

Feliz ano Novo aos sonegadores de esperança e aos que crêem apenas nos valores da Bolsa. Aos mancos de bondade, cegos de utopia, ébrios de ambições e medrosos perante a ousadia de viver. Aos que têm asas e não sabem voar, são águias e ciscam como galinhas, guardam em si um tigre e miam como gatos.

Feliz ano Novo aos que se agasalham com gelos e jamais dão ouvidos à sabedoria do fogo. Aos que alugam a própria dignidade e se revestem da ideologia do consenso. Aos que escondem montanhas debaixo da cama, congelam estrelas no bolso e torcem o arco-íris até sangrar.

Feliz ano Novo aos que exibem no pedestal de sua mente o próprio corpo, jejuam por razões estéticas e mendigam aos olhos alheios a moeda falsa da admiração convencional. Aos que ficam inebriados diante da paisagem televisiva e, como Carolina, vêem o mundo passar pela janela. Aos que proferem palavras furtivas, segredam mentiras sonham com elefantes de papel e tentam fugir da própria sombra.

Feliz ano Novo aos voluntários da servidão, aos que amam amar amores e desamores alheios e nunca experimentam o êxtase de uma paixão inefável. Aos crentes desprovidos de fé, aos políticos vazios de senso cívico, aos democratas que engraxam sapatos e dormem ao som de cornetas.

Feliz ano Novo aos que fazem de seus dias tijolos de catedrais escuras, navegam em pingo d’água e jamais perdem tempo com uma criança. Aos que cimentam árvores, fazem pontaria em orquídeas e pintam o verde de marrom. Aos que jamais escutam o silêncio, vociferam palavras sem nexo e tratam seus semelhantes como os motoristas reclamam dos buracos na estrada.

Feliz ano Novo aos que cercam suas almas com arame farpado, abrem com foices seus caminhos na vida e, ainda assim, não sabem que rumo tomar. Aos que traçam labirintos em seus mapas imaginários, enfeitam a vida com buquês de impropérios e rasgam o ventre da água com os seixos adormecidos no leito de seus rios.

Feliz ano Novo aos que cavalgam em hipocampos de feltro grávidos de dinamites, multiplicam teorias para subtrair a prática e escondem o horizonte no fundo da gaveta.

Feliz ano Novo aos que se julgam imortais, incensam a própria imagem e tocam címbalos aos cifrões que servem de prisão aos que estão terminantemente proibidos de tomar em mãos vazias de dinheiro um prato de comida.

Feliz ano Novo a todos os infelizes que fazem de suas vidas Lua minguante e se vestem com o escafandro de seus temores, afogados no sal de um oceano ressecado. Novos lhes sejam o ano e a vida, revertidos e revestidos de ensolaradas esperanças.

Robinson Bucci, 12/2006

Postado por Thami