quarta-feira, 27 de novembro de 2013

Possibilidades.

Nada mais faz sentido. A razão sucumbiu aos gritos desesperados da loucura. A insanidade se apossou da mente como um vírus que consome a célula. Como um câncer. Um olhar azul frígido se estancado em sua face inexpressiva, podia ver-se, vez ou outra, um leve marejado, numa tentativa frustrada e recobrar o juízo. Os cabelos grisalhos desarrumados, já compridos pela falta de interesse em cortá-los, sujos e oleosos, e a barba por fazer, com algumas duzias de fios brancos emaranhando-se aos negros, demonstram ser vítimas dos maus dias.

Quantos dias se passaram? Não se sabe. O tempo não caminha mais como antes. Se demora propositalmente, talvez. O faz para atormentá-lo. O corpo magro não sente fome. Não sente sede. Não sente frio. Não sente nada, enquanto caminha por qualquer lugar, em qualquer hora, em qualquer sentido, envolto em seu casaco surrado, comido pelo tempo. O jeans velho já não passa de um trapo, enquanto os sapatos são instrumentos de tortura. O corpo cansado não tem mais vida. Dia após dia, sofrimento. A garganta apertada. A agônia no silêncio da noite. Depressão. Desespero. Neste meio, há apenas um desejo profundo, da alma, de libertar-se. De correr ao infinito. De poupar o corpo do inferno de estar vivo. 

A cada dia, este desejo cresce. Inunda seus pensamentos. Seus olhos contemplam as possibilidades. Por um instante parece sensato. Mas que benefício lhe traria? O desconhecido o assusta mais que a própria vida. Está agrilhoado ao fardo da tristeza. A morte ri de sua fraqueza, enquanto está jogado em meio às fétidas acusações do superego, enquanto a vida lhe espanca e um mísero resquício de lembranças ainda o dá forças para tentar manter-se, porém, a lucidez o abandona gradativamente, e as possibilidades se restringem a falsas esperanças.

Estaria disposto a qualquer coisa para erradicar a dor dentro do seu peito. Para espantar os demônios que o assolam à noite. Para ter paz. Faria qualquer coisa para ter de volta sua razão. Para ter de volta a vida que tinha. Para enfrentar as convicções erradas, e criar novos conceitos. Venderia sua alma, ou o restante dela, para poder aprender tudo novamente. Para rir novamente. Para sentir fome e frio. Venderia a alma para tê-la por um dia.

Somente um dia, e lembraria o que é felicidade.

domingo, 10 de novembro de 2013

As estrelas não brilham

No meio da madrugada, enquanto meninos estouram rojões no morro para avisar a galera do suposto perigo, eu durmo.
As 5h quando a entregadora de jornais está fazendo café antes de ir trabalhar, eu ainda estou dormindo.
Enquanto o servente de pedreiro está comendo sua marmita, as 11h da manhã, eu estou na aula.
Enquanto alguns agonizam em seus leitos de hospitais, estou navegando na internet.
Enquanto a menina vende CDs pirata em um bar ao ar livre, eu como peixe no mesmo bar.
Enquanto a mãe leva o filho para fazer quimioterapia, as 7h da manhã, no ônibus lotado, eu estou me sentindo cansada e injustiçada, no mesmo ônibus, em pé.
Enquanto o cachorro abandonado está procurando comida no lixo, eu estou fazendo carinho na minha cachorra e a achando o cão mais especial e único do mundo.
Enquanto a criança que apanha do pai e tem a mãe com câncer, está na escola em uma tarde no meio da semana, eu estou tentando me enturmar em uma festa cheia de imbecis.
Enquanto essa mesma criança brinca na hora do recreio, eu tomo mais um copo de bebida para ficar mais sociável.  

Postado por Thami